Médico da Unicamp desmistifica uso de agrotóxicos por trabalhadores rurais
Professor-doutor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp), Ângelo Zanaga Trapé conversou com a equipe AgroSaber sobre intoxicação, câncer e outros temas ligados ao uso dos defensivos químicos, mais conhecidos como agrotóxicos.
Confira o nosso ping-pong:
1 – Há quanto tempo o senhor estuda a relação dos agrotóxicos com a saúde?
Me formei há 42 anos e há 40 anos comecei a trabalhar como médico. Nesta atividade, como médico do trabalho, comecei a identificar efeitos relacionados ao uso dos defensivos.
É curioso que um dos primeiros casos de intoxicação que eu vi na faculdade foram de dois burros. O veterinário veio me chamar porque eles estavam com intoxicação porque pulverizavam a parte de cima de onde eles ficavam.
No final das contas, salvamos os burros! A partir daí eu só trabalhei, examinei, analisei agricultores e pessoas com exposição a agroquímicos.
2 – O que mudou há 40 anos sobre o tema agrotóxico?
Mudou muito. Há 40 anos tínhamos menos conhecimento da toxicidade dos produtos e como eles agiam nos seres humanos. Tínhamos poucas informações e alguns produtores tinham interesse comercial muito intenso.
Então, o interesse comercial supera o setor técnico das empresas. Isso prejudicava muito porque queria se vender uma quantidade grande de produtos, muitas vezes sem necessidade de combater a praga, mas era aquela história: ‘preventivamente ‘evite que a praga chega a sua lavoura’… e isso foi mudando muito na medida que o próprio setor percebeu que era necessário um trabalho socialmente mais responsável.
A partir daí as coisas começaram a melhorar, por exemplo: o número de intoxicações ocupacionais era muito alto. Você encontrava agricultores com intoxicação, óbitos por exposição indevida… Hoje temos um número muito próximo de um limiar baixo.
Ninguém quer gastar dinheiro à toa, não existe ‘despejar’ agrotóxico mundo afora. É um produto caro, então hoje existe a tecnologia da precisão, onde a aplicação é muito mais reduzida, tanto que o Brasil é o 7º no mundo por hectare, o 1º é o Japão.
Faz 10 anos que o Centro de Controle de Intoxicações da Unicamp não registra nenhum caso de intoxicação aguda de origem ocupacional, só tentativa de suicídio ou homicídio.
Se você pegar hoje os dados que vem do Sistema Nacional de Informação Toxicológica, o número de intoxicação está entre 1000, 1200 casos, sendo que 900 ou 1000 são tentativas de suicídio. Isso no Brasil inteiro. O país parou de ser tupiniquim para ser um Brasil realmente em desenvolvimento e a agricultura brasileira é o que sustenta o mundo.
3 – As pessoas ainda tem a ideia de que agrotóxico faz mal?
Ainda tem hoje uma cultura, muito estimulada por ONGs e a mídia, sobre situações que muitas vezes não são embasadas cientificamente. Eu vejo profissionais, indivíduos de nível superior falando coisas bem absurdas sobre agrotóxico.
Os dados do programa de análise e resíduos de agrotóxicos em alimentos mostram uma extrema segurança química nos alimentos produzidos na agricultura brasileira. Então, isso vem dessa época.
A mudança ainda é muito tênue, mas temos que perseverar em informações técnicas e científicas que vem pela experiência acumulada na área da saúde e agricultura.
4 – É fake news que agrotóxico causa câncer?
Sem dúvidas. Não tem nenhum estudo indicando isso. Nenhum trabalho robusto que relacione ser agricultor e desenvolver algum tipo de câncer. Recentemente o INCA divulgou uma tabela de taxa bruta de câncer por aparelhos do estado do Mato Grosso, um estado agropecuário.
A taxa bruta de câncer dos habitantes de Cuiabá, a capital, é muito maior do que o resto do estado, o que é uma incoerência, já que na capital não se aplica agrotóxico. Existe muito achismo nisso, sem base científica que possa colaborar com esta relação. Não existe isso, isso não é uma verdade científica.
5 – O que é melhor comer: o orgânico ou o convencional?
Não tem que ter conflito nenhum, né? Quando você pensa em escala comercial é outro departamento, as pessoas não entendem. Isso vem de uma produção de milhares de toneladas de tomate e vem de uma tecnologia avançada.
Agora a grande questão, que eu acho uma perversidade é o valor. O convencional tem uma relevância mundial, o orgânico tem focal.
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