“Não sou pessimista. Acho que o problema não será mais grave do que já está acontecendo agora”, diz Roberto Rodrigues
Em entrevista exclusiva ao AgroSaber, Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, fala sobre os impactos do coronavírus para o agro
Natural de Cordeirópolis (SP), o engenheiro agrônomo Roberto Rodrigues, 77 anos, tornou-se uma das personalidades mais influentes do agro brasileiro. Foi secretário de agricultura no Estado de São Paulo e já comandou o Ministério da Agricultura. Atualmente é o coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas e embaixador especial para o Cooperativismo da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. Ele conversou exclusivamente com o AgroSaber sobre os possíveis efeitos que o novo coronavírus pode causar ao agro brasileiro. Confira.
AgroSaber – O senhor vê algum impacto do novo coronavírus para o agro brasileiro?
Roberto Rodrigues – Até o mês de fevereiro, não. Está claro que o valor exportado para a China, até o mês passado, foi maior. Mas o volume exportado foi menor. Então, o que houve foi uma melhoria de preços, sobretudo das carnes. O fato é que houve uma melhoria das exportações e uma redução das importações, sobretudo no segmento de autopeças para a indústria de máquinas agrícolas e de insumos. O resultado disso é que o saldo comercial do agro brasileiro melhorou em relação ao mesmo mês do ano passado, fevereiro.
AgroSaber – O que podemos esperar de agora em diante?
Rodrigues – Daqui para frente eu não acredito que seja melhor para o agro, mas por enquanto, também não há certeza de que será muito pior. Vai depender fundamentalmente do tempo de duração dessa crise.
AgroSaber – Por quê?
Rodrigues – O que está acontecendo é que pode haver uma piora dos sistemas logísticos e de distribuição com o coronavírus. Isso acaba evidentemente reduzindo a demanda. Se esse processo demorar muito tempo, pode haver um prejuízo mais sensível. Mas todas as notícias disponíveis hoje, estão na direção de que a gripe está diminuindo na China. Não sou pessimista. Acho que não haverá um problema mais grave do que já está acontecendo agora. O prejuízo haverá, mas será menos importante do que se o coronavírus estivesse muito ativo na China e em outros países asiáticos.
AgroSaber – Há algum porém?
Rodrigues – Há sim. Por outro lado, as pessoas têm de se alimentar. E esse é um tema que interessa a todo e qualquer governo. Um país com alimentação precária derruba um governo. Esse tema da alimentação é estratégico para o governo chinês. Ele tem uma visão muito clara e executa as estratégias que traça. Estou com uma esperança de que o resultado não seja tão grave.
AgroSaber – A queda das importações de produtos chineses pelo Brasil é um fator (ponto) negativo?
Rodrigues – É ruim. Já vemos um prejuízo com a redução da importação brasileira de componentes para o agro, de equipamentos e de insumos. Pode haver um problema que seria agravado obviamente pela questão cambial. Com o dólar mais elevado e mais caro, isso pode gerar um problema de custo para o produtor brasileiro. Mas a minha expectativa de que o tema exportação, ainda que haja diminuição de volumes, não haja uma redução de resultado econômico.
AgroSaber – Qual a impressão (percepção) dos demais setores do agro, em suas conversas com representantes de empresas e entidades?
Rodrigues – Tenho conversado com alguns exportadores brasileiros e o sentimento é parecido. A sensação é que o Brasil tem um risco muito grande, como se houvesse uma espada no pescoço de todo mundo, mas, por enquanto, os prejuízos não foram fortes.
AgroSaber – A saúde do agro brasileiro pode superar os desafios que estão por vir?
Rodrigues – É uma questão de difícil resposta porque tudo vai depender da duração desse processo. O fato é que o agro está enfrentando isso com certo preparo. Agora, imagine uma redução significativa, por exemplo, nas importações de soja da China. Nós temos um problema no Brasil que é o de armazenagem. Temos ainda uma logística um pouco precária. Então uma redução significativa da exportação desse grão pode representar um problema razoavelmente complicado, porque haverá dificuldade para guardar essa produção. É bom lembrar que estamos colhendo uma safra recorde. Se houver uma redução muito significativa, teremos reflexos negativos porque não teremos estrutura de armazenagem para guardar toda a produção não escoada.
AgroSaber – Há algum prejuízo para a produção brasileira de carnes?
Rodrigues – Para a produção de carnes não vejo problemas. Até porque, no caso específico de carnes, a demanda não deve esfriar. Pelas questões anteriores como a peste suína africana e outros problemas lá na China. Então, eu acho que aí, deverá haver uma demanda aquecida. Não vejo, num horizonte de curto prazo que essa demanda por carne esfrie. O grão é o mais complicado.
AgroSaber – Qual a sua mensagem para o agro?
Rodrigues – Minha mensagem é que os produtores realizem seus negócios rapidamente para tirar a produção da fazenda. Ficar livre da produção, mandando para um armazém ou mandar para fora. O que puder tirar da fazenda e arrumar um lugar para guardar será muito melhor. Melhor ainda é exportar. Quanto mais rápido, melhor. Não vejo grandes riscos para os produtores brasileiros se eles fizerem esse escoamento da forma mais adequada.
O AgroSaber continua no encalço dos impactos do novo coronavírus no agro brasileiro. E aí gostou da matéria? Você pode: curtir, comentar e compartilhar. (os links de suas redes sociais estão logo aí abaixo)