Desrespeito às leis, o grande veneno do Brasil
Os casos de intoxicação por defensivos agrícolas no Brasil são causados por erro humano e desrespeito às leis, não pelos produtos em si. Vemos com frequência reclamações de ambientalistas sobre pessoas sendo contaminadas por defensivos agrícolas. De fato, não se pode negar que essas intoxicações acontecem.
Mas você já parou para pensar que o problema pode não ser os produtos, mas sim com as pessoas?
Você costuma deixar medicamentos ao alcance das crianças? Você entregaria uma arma nas mãos de uma pessoa despreparada para utilizá-la? Sabemos que as respostas são negativas. Da mesma forma, é necessário fazer o uso correto desses importantes produtos.
A lei dos defensivos agrícolas no Brasil está prestes a mudar e para isso, tramita na câmara dos deputados o Projeto de Lei 6299/02, que busca atualizar a regulação do uso dos defensivos agrícolas.
Hoje, leva em média oito anos para a aprovação de um novo defensivo no Brasil, sendo necessário que Anvisa, Ibama e Ministério da Agricultura deem o sinal verde para introdução destes novos produtos no mercado. Esse processo faz com que o Brasil seja obrigado a usar produtos obsoletos tecnologicamente, frente a outros países produtores.
Quando a nova lei for aprovada, haverá produtos mais modernos para usar nas lavouras e muito do que está disponível hoje poderá ser deixado de lado.
Mas, ainda assim, é necessário respeitar tanto a lei atual, enquanto ela está em vigência, como a futura, quando ela finalmente deixar de ser apenas um projeto. As regulamentações facilitarão a entrada dos melhores produtos no mercado nacional.
Mesmo com a lei atual, os relatos de intoxicação no Brasil são fruto de erro humano, não culpa dos defensivos agrícolas. Um exemplo é o caso acontecido em Rio Verde, interior de Goiás, em 2013.
Um avião passou pulverizando um produto sobre uma lavoura de milho que ficava vizinha a uma escola infantil, atingindo diretamente crianças e professores, deixando noventa e dois feridos. Esse caso é sistemático: houve um grande desrespeito às leis.
De acordo com a sentença do juiz federal Paulo Augusto Moreira Lima, que julgou procedente o pedido coletivo de indenização das vítimas, o produto em questão poderia ser aplicado apenas por via terrestre, jamais aérea. Isso está claro, inclusive, na bula e nas instruções de uso.
Desde 2012, também já havia orientação direta do Ibama para que não se usasse esse defensivo em milharais por aplicação via avião ou similar. Percebemos então que um grande desastre como esse, que levou à contaminação de tantas pessoas inocentes, poderia ter sido facilmente evitado simplesmente se a legislação vigente tivesse sido seguida.
O artigo 12 B da Lei número 7802/89 deixa claro: “Na aplicação de agrotóxicos deverão ser adotadas medidas e utilizados equipamentos que ofereçam segurança às pessoas, ao meio ambiente, aos animais de criação e que minimizem o risco de deriva do produto para além do alvo da aplicação”.
Pode-se concluir, portanto, que existe uma necessidade de proteção a todos aqueles que estão em volta das áreas agrícolas e poderiam correr risco de contaminação e que para evitar novos acidentes é necessário seguir a legislação.
Existe uma “zona de segurança” que normalmente é determinada quando existem moradores em torno de grandes áreas agrícolas. Nessa zona, não é permitida a aplicação via aérea dos defensivos, uma vez que eles acabam deixando partículas no ar e atingindo diretamente as residências e as pessoas.
No caso do ocorrido em Rio Verde, isso foi desrespeitado. Para piorar, uma rápida busca na Internet mostra que é praxe, principalmente no estado de Goiás, que esse tipo de desrespeito às leis aconteça.
A Human Rights Watch, organização internacional que luta pelos direitos humanos, relata casos de intoxicação em seis outros estados brasileiros: Pará, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Paraná. Na maior parte dos casos, o motivo citado é “o desrespeito às zonas de segurança”.
Ou seja, mais uma vez temos problemas pelo fato das pessoas estarem passando por cima das leis, ignorando os direitos do próximo e pulverizando defensivos agrícolas por via aérea em lugares que são habitados por pessoas.
O relatório da organização pede por uma maior fiscalização nas áreas rurais com população para que se possa respeitar adequadamente as zonas de segurança e uma punição para quem as desrespeita. Seriam medidas fundamentais para acabar com os erros humanos que levam à intoxicação por esses produtos.
Sabemos da importância que os defensivos agrícolas possuem: sem eles, não há safra no Brasil. As espécies de pragas que existem por aqui se proliferam com mais facilidade devido ao clima tropical. Temos muitas pessoas para alimentar e não podemos contar apenas com a produção orgânica de vegetais.
O agronegócio é fundamental para combater a fome no nosso país e até mesmo para gerar riquezas com a exportação. Não podemos deixar tudo à mercê de espécies terríveis como a lagarta-da-espiga do milho.
A Dose
O paralelo dos defensivos agrícolas com os remédios é perfeito: existe uma série de instruções sobre seu uso que, quando seguidas, traz benefícios. Dosagem, modo de uso, manter fora do alcance das crianças e dos animais, validade, local de armazenamento.
Tudo isso se aplica aos pesticidas – quando usados de maneira descuidada e fora da lei, podem causar intoxicações e problemas, mas as regulamentações existem para que eles possam cumprir seus papéis de eliminarem as pragas das nossas lavouras sem nenhum tipo de consequência negativa!